sábado, 26 de fevereiro de 2011

O menino da mochila

Usava sempre aquela mochila simples e azul desbotada pelo desgaste do tempo. Se ela tivesse vida com certeza usaria um creme anti rugas. Por mais que a mãe insistisse em compar-lhe uma mochila nova ele a contrariava: - Gosto dessa, combina comigo. O menino também era simples.

Passava perto do mar todos os dias para ir à aula. Bom observador que era, deixava sempre que a maresia o inspirasse.
Talves por isso escrevia tanto durante as aulas.
Porque vinha inspirado.
No caderno que ele tanto cuidava haviam tantas palavras soltas, citações e desabafos mas ninguém podia olhar. Tratava com raridade e uma ponta de timidez.Só ele e a mochila azul o possuíam.

Por falta de ter com quem falar escrevia, diziam alguns. Vendia até uma imagem de garoto distraído – que vive rabiscando papel. Ah, como estavam enganados.
Os colegas da aula até perguntavam e ficavam curiosos pelo o que ele tanto escrevia.
–É que estou sempre pensando. E não posso deixar o pensamento fugir. Escrever foi a maneira que encontrei de prendé-lo.

Aqueles ali não eram os seus amigos. Os seus verdadeiros amigos. Até gostava bastante de alguns mas os seus de verdade estavam perto do mar. Não desse mar por qual ele passava todos os dias. Um outro mar. Mais azul, com mais ondas.
E com mais atenção.
E mais amor.

3 comentários:

  1. Show!
    O mar é realmente fascinante e inspirador.
    O mar que temos dentro de nós mesmos...
    Ótimo texto!
    Abraço!
    www.segundadose.com

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  2. Não vou dizer que me identifiquei porque nunca tive uma mochila assim, uma que eu quisesse manter; do contário, eu estava sempre descontente, querendo uma nova a cada novo ano, a cada nova esperança... Demorou até eu entender que o problema não era a mochila, mas as minhas prioridades, aquilo que eu carregava ali dentro.

    Mineiro que sou, acostumado ao recorte das montanhas no horizonte, nunca entendi muito bem o que fui fazer em Florianópolis. Eu poderia ter ido para outra cidade em Minas, tinha opções em São Paulo, montanha, montanha, montanha...

    "Um outro mar. Mais azul, com mais ondas.
    E com mais atenção.
    E mais amor."

    Era o mar, era o mar que eu queria.
    Um mar diferente daquele mar de morros, um mar de água, água e sal, de verdade, para mergulhar.

    E não é que dei a sorte de encontrar gente maravilhosa ali perto do mar?

    Ler isto, num momento em que andei conhecendo outros mares (o de Laguna, o do Rio), foi como um abraço. Obrigado.

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